domingo, 5 de abril de 2020

Do Capuchinho vermelho (II)

São as histórias infantis uma construção cultural, um marco de uma civilização, ou só sinais de um tempo? A Infância como explicou Helena Vasconcelos é um território desconhecido. Quando se o habita não se tem consciência desses passos a aguardar aventuras no colapso do tempo. Quando se cresce esse é um reino que se perdeu a memória mais viva. Mas, existem histórias infantis que percorrem muitas gerações, ainda que com pontos de partida semelhantes, chegam a resultados diversos. 

 O Capuchinho vermelho é um exemplo disso. As crianças como hoje as reconhecemos não existiam no século XVII. No entanto a história parece ter em si uma componente de ensinamento para públicos mais vastos. É claramente um conto que é oriundo na narrativa clássica. Viajou por diferentes séculos e adaptou-se a culturas clássicas. Na Itália do século XIX a figura do lobo é substituída por um ogre. Existem pontos de ligação do Capuchinho vermelho a outras histórias, como O lobo e os sete Cabritinhos, entre outros. De algum modo a história criada por Perrault consegue que o mundo adulto tenha uma representação social da infância e nesse sentido tem um contínuo sentido educativo.

  O interessante de verificar é que O Capuchinho Vermelho se tornou a matéria-prima para uma ampla difusão de ilustrações e de livros de diferentes formatos. Os livros-objeto ganharam neste tema grande difusão, dando às imagens a possibilidade de criação de leituras próprias, como os livros pop-up, ou os que usando materiais específicos fazem uma leitura visual da história, com a possibilidade de realização de interpretações e ligações visuais diversas, entre muitos outros. O significado dos gestos mostra-nos que é mais do que uma simples história para avisar donzelas indefesas ou crianças aventureiras.

 O Capuchinho vermelho, como salientou Bruno Bettelheim é uma narrativa para nos explicar que os limites da bondade humana residem em nós próprios, na nossa natureza. É uma história sobre o desejo, o poder, a violência e a desobediência. É uma história para educar os que ainda não se aperceberam dos perigos. Mas é ainda um pouco mais do que isso. Há em Capuchinho Vermelho algo de atraente e sedutor, pois ela é de certo modo uma figura disfarçada, pois o que ela procura é construir uma desobediência. 

 Desobediência temporal, faseada em relação à mãe, pois a divergência é alma da história. Se ela seguisse todas as regras, onde ficaria a história? O seu percurso é feito de escolhas pessoais, de pontos escolhidos no caminho. Capuchinho vermelho é no fundo uma heroína, por afrontar esse medo e essa substância prefigurada no lobo que pode ter muitas figuras. O vermelho e a sua iconografia ligada à paixão por uma causa, por um desejo, por uma liberdade individual liga-a, talvez aos ideais republicanos que a França e outros países viveram com o fim das monarquias.

 Imagens: Beatriz Martin Vidal e Lucy Fleming

sexta-feira, 3 de abril de 2020

Se eu fosse um livro...

O que pode ser um livro se fosse representado por cada de um de nós. José Jorge Letria e André Letria dão a resposta num vídeo que nos devolve os desejos mais secretos e mais belos do livro, de todos os livros.
 Se eu fosse um livro, José Jorge Letria / André Letria, da Pato Lógico