sábado, 31 de outubro de 2020

Pó de estrelas

                                                                  Buracos Negros

"As estrelas também gostam de brincar
às escondidas
A maioria das vezes escondem-se umas atrás das outras
ou nas imediações de um quasar
Mas não há melhor lugar
para uma estrela se esconder
que num buraco negro
Elas vêm as outras
e ninguém as consegue ver"
 
 
Pó de estrelas é um livro de Jorge Sousa Braga que nos devolve essa ideia que Joni Mitchel um dia cantou em Woodstook e que Carla Sagan comprovaria como correcta. A de que somos feitos de estrelas, de um pó de cometas em viagem pelo espaço. Pó de estrelas que nos devolve o nosso rosto revestido dos sinais dos planetas e das estrelas que connosco habitam um universo, quase desconhecido e fascinante de possibilidades. Cristina Valadas ilustrou o livro coma utilização de técnicas de colagem dando cor e textura a este pó de estrelas que compõe um universo, o nosso.

"Buracos negros", in Pó das Estrelas / Jorge Sousa Braga, Il. Cristina Valadas. Lisboa; Assírio &A Alvim. 2004.

domingo, 18 de outubro de 2020

A árvore generosa

A Árvore generosa é um título escrito em 1964 e que se tornou um clássico a tratar a questão ambiental, ou seja a relação do Homem com a Natureza. É um livro que se nos apresenta com pouco texto e que nos conduz muito pela ilustração para nos dar uma mensagem simples e forte. A da generosidade da Natureza concedida ao Homem. 

 A Natureza está aqui personificada na figura de uma criança, de um menino que cresce. É a partir de uma entrega sem condições da árvore a um menino que nos surgem diferentes temáticas. A Natureza é a mais evidente, mas também as questões do tempo, a amizade, o crescimento e as escolhas de vida e o modo como respondemos aos desafios com que todos vamos sendo confrontados. Voltando aos temas sem dúvida que ela nos conduz à generosidade da Natureza em confronto com a mesquinhez do Homem.

 Nessa condução pela generosidade vimos como os desejos são muitas vezes ausentes de afecto, descomprometidos com uma sinceridade genuína face aos outros, neste caso face à árvore. No fim a obra coloca-nos um outro tema essencial, o do amor incondicional, dos seus perigos, da sua pertinência para a sobrevivência de algo. Resta uma última pergunta. Deveria a árvore amar tão incondicionalmente a ponto de se esquecer de si própria de um modo tão substantivo? 

A obra A árvore generosa levanta questões muito relevantes. Em primeiro lugar a questão do valor da Natureza e o que ela dá generosamente à espécie humana. Relacionado com esse tema está o tempo, o crescimento, as escolhas de vida. A generosidade da árvore é possível ser transposta para a vida humana? É possível alargar esse rio de possibilidades até a um fim que signifique quase a sua inexistência? Afinal o que pode ser um amor incondicional e, como ele sobreviver nessa generosidade sem fronteiras? No fim resta uma pergunta, deveria a árvore amar tão incondicionalmente? A obra é de facto um título pioneiro em muitos aspetos e é nesse sentido um livro que em diferentes gerações pode trazer um questionamento substantivo a quem a ler.  Se A árvore generosa é evidentemente uma bela história consegue igualmente chegar a um patamar mais elevado,o de fazer um questionamento e o de atingir um sentido de educação ecológica, aspetos tão necessários na educação literária e na formação da cidadania.

 A árvore generosa / Shel Silverstein / A árvore generosa. Figueira da Foz: Bruaá, 2011.

sábado, 10 de outubro de 2020

A viagem de Djuku

 

"No exacto momento em que parte, Djuku apercebe-se de que é a primeira vez que deixa a sua aldeia.
Desde o seu nascimento até hoje, Djuku viveu sempre rodeada pelos seus na pequena aldeia à beira da savana. Ela conhece cada recanto. E ninguém lhe é ali desconhecido. Do mesmo modo, todos os aldeões sabem quem é Djuku:
— Djuku? É aquela que sabe assobiar, melhor até do que um pássaro!
— Quando há por aqui almoço de festa ou de cerimónia, é sempre Djuku quem os faz: ela conhece todas as receitas e até inventa mais!
É verdade que Djuku cozinha galinha como ninguém, mas hoje Djuku vai-se embora. Decidiu partir para longe, muito longe. É que aqui na aldeia, apesar dos amigos, apesar das cerimónias, não há trabalho suficiente.
Fez-se à estrada e fixa os olhos na linha do horizonte para não se voltar, para não chorar. Bem, vamos lá a ver, partir assim é demasiado duro. Então, uma última vez, e antes que a aldeia desapareça na desordem das ervas altas, ela olha-a. Olha-a durante tanto tempo e tão apaixonadamente que todas as coisas onde o seu olhar toca entram no seu corpo.
Agora sim, Djuku pode pôr-se a caminho.
A velha guitarra de Quecuto entra no seu corpo. E com ela todos os perfumes das músicas tantas vezes ouvidas.
A palmeira inclinada e o embondeiro do largo entram no seu corpo.
O caldeirão de Nhô-Nhô entra no seu corpo.
A casa de Pepito entra no seu corpo, apesar do seu tecto desgrenhado.
A barca e as redes de pesca de Benvindo que repousam sobre a areia entram no seu corpo. Sente que todas estas coisas estão dentro dela firmemente atadas como carga de um navio. Sente que, a cada passo dos muitos que dará, a aldeia estará consigo."

 A Viagem de Djuku / Alain Courbel e Éric Lambé. Alfragide: Caminho,